Política – Esse
é um daqueles temas “espinhosos”, uma peça com muitos recortes e que por vezes
não se sabe exatamente que lado priorizar na sua abordagem. Mas para início de
conversa, sempre é bom lembrar que quando se fala de política, não se deve
confundir com aquilo que popularmente denomina-se “politicagem”, pois esta é
uma forma de deturpação da política. Politicagem é uma maneira diferente de
falar sobre corrupção. Política diz respeito às relações e formas de vida em
sociedade.
O conceito
política, originariamente, faz referência a tudo que pertence à cidade,
consequentemente aquilo que é público, civil, social, relacionado ao governo,
etc. Por isso o tema é amplo, sempre atual e de abordagem dinâmica.
Mas, não se
deve esquecer que a ideia de política também está intimamente associada à
questão do poder ou, ainda, ligada às relações de poder para se alcançar
determinados fins ou objetivos – tratando-se de um poder político.
Um caso extremo
do abuso do poder se dá pelo chamado Estado Totalitário, uma forma de governo
em que todos os limites de poder são destituídos e se estabelece a politização
completa das relações sociais, e consequentemente a destituição da própria
liberdade – uma forma tirânica e escravocrata opressora de governar.
Isso remete ao
fato da importante consciência da concessão do poder. Quando você elege alguém,
o faz como representante e lhe concede poderes que devem ser usados para o bem
comum. Caso isso não se efetive, houve irresponsabilidade no voto ou o poder
concedido foi mal usado e os resultados são os frutos amargos da corrupção, que
normalmente trazem uma diversidade de males, prejuízos e injustiças para a
grande maioria da população.
Em nossa atual
forma de governo no Brasil, faz-se a concessão de poder para pessoas que possam
representar a vontade do povo – a ideia de democracia significa “poder/governo
do povo”. Tem-se aqui, uma primeira esfera de responsabilidade, a do voto e dos
líderes instituídos. Isso significa que apesar das informações distorcidas que
se propagam com outras bem-intencionadas, que apesar de alguns terem outros
interesses ocultos, que não o bem comum, o cristão cidadão precisa laborar
politicamente para que o bem, a justiça e a verdade sejam instituídos. E isso
se faz, também, através de voto consciente, repúdio à falsidade e à injustiça,
um envolvimento muito mais amplo do que digitar um número em uma urna
eletrônica. Afinal de contas o cristão, enquanto no mundo, está vivendo em uma
sociedade politizada e suas ações também são, querendo ou não, ações políticas
envolvendo o poder/capacidade/obrigação de decidir sobre o presente e futuro da
sua vida e da vida de muitos outros.
Negociatas
corruptas, compra, venda ou troca de favores envolvendo o poder público em prol
de benefícios particulares, é inadmissível para qualquer um, especialmente alguém
que diz ser cristão. Isso faz pensar, que os genuinamente cristãos que estão
mais engajados politicamente, especialmente aqueles que são candidatos ou já
assumiram algum cargo de liderança pública, vivem uma intensa guerra e precisam
de apoio – não apoio religioso-eclesiástico-partidário. Apoio, como a própria Bíblia
observa que se faz, especialmente, pela oração (Rm 13.1-7) e também obediência
tendo em vista serem estes líderes reconhecidos como estando ajustados aos
padrões de liderança de Deus para o mundo, onde se preserva a própria liberdade
que Deus dá ao ser humano para fazer suas escolhas, mas não se oculta o quanto
Deus ama e zela pela vida.
Rm 13.1-7 diz: “1.Todos
devem sujeitar-se às autoridades governamentais, pois não há autoridade que não
venha de Deus; as autoridades que existem foram por ele estabelecidas. 2.Portanto,
aquele que se rebela contra a autoridade está se colocando contra o que Deus
instituiu, e aqueles que assim procedem trazem condenação sobre si mesmos. 3.Pois
os governantes não devem ser temidos, a não ser pelos que praticam o mal. Você
quer viver livre do medo da autoridade? Pratique o bem, e ela o enaltecerá. 4.Pois
é serva de Deus para o seu bem. Mas se você praticar o mal, tenha medo, pois
ela não porta a espada sem motivo. É serva de Deus, agente da justiça para
punir quem pratica o mal. 5.Portanto, é necessário que sejamos submissos às
autoridades, não apenas por causa da possibilidade de uma punição, mas também
por questão de consciência. 6.É por isso também que vocês pagam imposto, pois
as autoridades estão a serviço de Deus, sempre dedicadas a esse trabalho. 7.Dêem
a cada um o que lhe é devido: Se imposto, imposto; se tributo, tributo; se
temor, temor; se honra, honra”.
Acompanhar
candidatos, participar politicamente dos espaços oportunos na constituição de
políticas públicas e assim por diante. Essas são outras esferas que muitos
cristãos negligenciam por desconhecimento ou limitada iniciativa. Espaços para
igualmente serem sal e luz da terra. Afinal, um bem como a salvação é
impossível não ser transbordado para um bem na vida coletiva, é a vida eterna
já inaugurada aqui e agora.
Ser sal e ser
luz significa que um salvo por Cristo, portador do Evangelho que transformou
sua vida, está vivendo essa realidade no mundo. E seja na política ou qualquer
outra esfera da vida humana, ela será influenciadora.
Entretanto,
para muitos, ainda parece incompatível a ideia de “cidadão” e “fiel”, mesmo que
isto se reconheça uma realidade quase diária da vida de todo o cristão. Ser cristão
político continua a ser uma ideia inadmissível – algumas expressões são: “eu
sou apolítico”, “eu não me envolvo com política”, “de política quero
distância”. Pergunto: É possível viver o tempo todo dentro da igreja (templo
físico) sem se envolver com mais nada? Acaso não se passa pela praça (ágora)
para discutir com alguém sobre a vida em sociedade? Não se faz isso no próprio
núcleo familiar? Na própria vida da igreja não existem relações de poder que se
exercem interna e externamente? E isso não é parte do fazer política? Se sim,
então o cristão também é político. Quando um cristão discute com sua família
sobre seus desafios, quando troca informações e emite sua opinião sobre
determinado assunto da sua vida em comum (em sociedade) com alguém, não está
ele sendo cristão cidadão e político, que faz parte de uma pólis
(cidade-Estado)? Então dizer-se apolítico não é uma realidade, mas uma fuga de
responsabilidade. Todo mundo é um bom ou mal político. Todo mundo faz algum
tipo de política. Todo mundo faz algo que é bom ou ruim para a vida em
sociedade.
Mas qual é a
responsabilidade política primeira do cristão? Evidentemente, que a
responsabilidade primeira, diz respeito ao viver sua identidade cristã. Isso em
termos práticos significa pensar, falar e agir como cristão em sociedade, de
forma a cultivar a vida cristã e o modo de vida decorrente do Evangelho em
sociedade, com todos os seus nobres valores. Não deixa de ser, primariamente, a
expressão de vida com Deus e ao mesmo tempo, o fazer político do cristão no
mundo. Não um cristão indiferente, alienado, mas um cristão cidadão que
compreende que o espaço público também é seu campo, sua esfera de testemunho
diário, de diálogo sobre os propósitos de Deus para a humanidade, espaço para
diálogo e deliberação, de participação efetiva na construção de políticas e
diretrizes para a vida. Ajudar a construir aquilo que revela o amor de Deus ao
ser humano e ao mundo. Como já expressado, não é lugar para desrespeito ou
violação do próprio direito de se fazer escolhas, mas a própria manutenção
desta dádiva concedida por Deus para exercício responsável.
A vida precisa
ser percebida em sua realidade. Um cristão, com a mente de Cristo e portador do
Evangelho vivendo em um mundo demarcado por carência de transformação e conhecimento
do amor de Deus. A vida no céu é uma certeza gloriosa, plena, perfeita para os
que estão “em Cristo”. A vida na terra, uma missão, percurso tenebroso,
limitado, imperfeito e, por isso, carente de toda e qualquer influência daquilo
que é superior, especialmente do ser sal e luz. Deus sabia o que estava fazendo
quando deixou o cristão mais um tempo na terra.
“Vocês são o
sal da terra. Mas se o sal perder o seu sabor, como restaurá-lo? Não servirá
para nada, exceto para ser jogado fora e pisado pelos homens. Vocês são a luz
do mundo. Não se pode esconder uma cidade construída sobre um monte” (Mt 5.13-14).
Pr José Roberto Cerqueira
(Pastor na Igreja Ministério Internacional Getsêmani-BA)
Nenhum comentário:
Postar um comentário