domingo, 22 de julho de 2018

RESPONSABILIDADE POLÍTICA DO CRISTÃO


Política – Esse é um daqueles temas “espinhosos”, uma peça com muitos recortes e que por vezes não se sabe exatamente que lado priorizar na sua abordagem. Mas para início de conversa, sempre é bom lembrar que quando se fala de política, não se deve confundir com aquilo que popularmente denomina-se “politicagem”, pois esta é uma forma de deturpação da política. Politicagem é uma maneira diferente de falar sobre corrupção. Política diz respeito às relações e formas de vida em sociedade.
O conceito política, originariamente, faz referência a tudo que pertence à cidade, consequentemente aquilo que é público, civil, social, relacionado ao governo, etc. Por isso o tema é amplo, sempre atual e de abordagem dinâmica.
Mas, não se deve esquecer que a ideia de política também está intimamente associada à questão do poder ou, ainda, ligada às relações de poder para se alcançar determinados fins ou objetivos – tratando-se de um poder político.
E quando se discute acerca do “em benefício de quem o poder é exercido”, abre-se um amplo campo de discussão, especialmente por integrar política (pelo consenso), economia (pelos bens e produção) e ideologia (pela coação). Por exemplo, o Brasil hoje, vive intensos momentos políticos com eixo econômico e ideológico, confrontos que envolvem a presidência da república e a situação econômica e não menos importante, ideológica da nação.
Um caso extremo do abuso do poder se dá pelo chamado Estado Totalitário, uma forma de governo em que todos os limites de poder são destituídos e se estabelece a politização completa das relações sociais, e consequentemente a destituição da própria liberdade – uma forma tirânica e escravocrata opressora de governar.
Isso remete ao fato da importante consciência da concessão do poder. Quando você elege alguém, o faz como representante e lhe concede poderes que devem ser usados para o bem comum. Caso isso não se efetive, houve irresponsabilidade no voto ou o poder concedido foi mal usado e os resultados são os frutos amargos da corrupção, que normalmente trazem uma diversidade de males, prejuízos e injustiças para a grande maioria da população.
Em nossa atual forma de governo no Brasil, faz-se a concessão de poder para pessoas que possam representar a vontade do povo – a ideia de democracia significa “poder/governo do povo”. Tem-se aqui, uma primeira esfera de responsabilidade, a do voto e dos líderes instituídos. Isso significa que apesar das informações distorcidas que se propagam com outras bem-intencionadas, que apesar de alguns terem outros interesses ocultos, que não o bem comum, o cristão cidadão precisa laborar politicamente para que o bem, a justiça e a verdade sejam instituídos. E isso se faz, também, através de voto consciente, repúdio à falsidade e à injustiça, um envolvimento muito mais amplo do que digitar um número em uma urna eletrônica. Afinal de contas o cristão, enquanto no mundo, está vivendo em uma sociedade politizada e suas ações também são, querendo ou não, ações políticas envolvendo o poder/capacidade/obrigação de decidir sobre o presente e futuro da sua vida e da vida de muitos outros.
Negociatas corruptas, compra, venda ou troca de favores envolvendo o poder público em prol de benefícios particulares, é inadmissível para qualquer um, especialmente alguém que diz ser cristão. Isso faz pensar, que os genuinamente cristãos que estão mais engajados politicamente, especialmente aqueles que são candidatos ou já assumiram algum cargo de liderança pública, vivem uma intensa guerra e precisam de apoio – não apoio religioso-eclesiástico-partidário. Apoio, como a própria Bíblia observa que se faz, especialmente, pela oração (Rm 13.1-7) e também obediência tendo em vista serem estes líderes reconhecidos como estando ajustados aos padrões de liderança de Deus para o mundo, onde se preserva a própria liberdade que Deus dá ao ser humano para fazer suas escolhas, mas não se oculta o quanto Deus ama e zela pela vida.

Rm 13.1-7 diz: “1.Todos devem sujeitar-se às autoridades governamentais, pois não há autoridade que não venha de Deus; as autoridades que existem foram por ele estabelecidas. 2.Portanto, aquele que se rebela contra a autoridade está se colocando contra o que Deus instituiu, e aqueles que assim procedem trazem condenação sobre si mesmos. 3.Pois os governantes não devem ser temidos, a não ser pelos que praticam o mal. Você quer viver livre do medo da autoridade? Pratique o bem, e ela o enaltecerá. 4.Pois é serva de Deus para o seu bem. Mas se você praticar o mal, tenha medo, pois ela não porta a espada sem motivo. É serva de Deus, agente da justiça para punir quem pratica o mal. 5.Portanto, é necessário que sejamos submissos às autoridades, não apenas por causa da possibilidade de uma punição, mas também por questão de consciência. 6.É por isso também que vocês pagam imposto, pois as autoridades estão a serviço de Deus, sempre dedicadas a esse trabalho. 7.Dêem a cada um o que lhe é devido: Se imposto, imposto; se tributo, tributo; se temor, temor; se honra, honra”.

Acompanhar candidatos, participar politicamente dos espaços oportunos na constituição de políticas públicas e assim por diante. Essas são outras esferas que muitos cristãos negligenciam por desconhecimento ou limitada iniciativa. Espaços para igualmente serem sal e luz da terra. Afinal, um bem como a salvação é impossível não ser transbordado para um bem na vida coletiva, é a vida eterna já inaugurada aqui e agora.
Ser sal e ser luz significa que um salvo por Cristo, portador do Evangelho que transformou sua vida, está vivendo essa realidade no mundo. E seja na política ou qualquer outra esfera da vida humana, ela será influenciadora.
Entretanto, para muitos, ainda parece incompatível a ideia de “cidadão” e “fiel”, mesmo que isto se reconheça uma realidade quase diária da vida de todo o cristão. Ser cristão político continua a ser uma ideia inadmissível – algumas expressões são: “eu sou apolítico”, “eu não me envolvo com política”, “de política quero distância”. Pergunto: É possível viver o tempo todo dentro da igreja (templo físico) sem se envolver com mais nada? Acaso não se passa pela praça (ágora) para discutir com alguém sobre a vida em sociedade? Não se faz isso no próprio núcleo familiar? Na própria vida da igreja não existem relações de poder que se exercem interna e externamente? E isso não é parte do fazer política? Se sim, então o cristão também é político. Quando um cristão discute com sua família sobre seus desafios, quando troca informações e emite sua opinião sobre determinado assunto da sua vida em comum (em sociedade) com alguém, não está ele sendo cristão cidadão e político, que faz parte de uma pólis (cidade-Estado)? Então dizer-se apolítico não é uma realidade, mas uma fuga de responsabilidade. Todo mundo é um bom ou mal político. Todo mundo faz algum tipo de política. Todo mundo faz algo que é bom ou ruim para a vida em sociedade.
Mas qual é a responsabilidade política primeira do cristão? Evidentemente, que a responsabilidade primeira, diz respeito ao viver sua identidade cristã. Isso em termos práticos significa pensar, falar e agir como cristão em sociedade, de forma a cultivar a vida cristã e o modo de vida decorrente do Evangelho em sociedade, com todos os seus nobres valores. Não deixa de ser, primariamente, a expressão de vida com Deus e ao mesmo tempo, o fazer político do cristão no mundo. Não um cristão indiferente, alienado, mas um cristão cidadão que compreende que o espaço público também é seu campo, sua esfera de testemunho diário, de diálogo sobre os propósitos de Deus para a humanidade, espaço para diálogo e deliberação, de participação efetiva na construção de políticas e diretrizes para a vida. Ajudar a construir aquilo que revela o amor de Deus ao ser humano e ao mundo. Como já expressado, não é lugar para desrespeito ou violação do próprio direito de se fazer escolhas, mas a própria manutenção desta dádiva concedida por Deus para exercício responsável.
A vida precisa ser percebida em sua realidade. Um cristão, com a mente de Cristo e portador do Evangelho vivendo em um mundo demarcado por carência de transformação e conhecimento do amor de Deus. A vida no céu é uma certeza gloriosa, plena, perfeita para os que estão “em Cristo”. A vida na terra, uma missão, percurso tenebroso, limitado, imperfeito e, por isso, carente de toda e qualquer influência daquilo que é superior, especialmente do ser sal e luz. Deus sabia o que estava fazendo quando deixou o cristão mais um tempo na terra.

“Vocês são o sal da terra. Mas se o sal perder o seu sabor, como restaurá-lo? Não servirá para nada, exceto para ser jogado fora e pisado pelos homens. Vocês são a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade construída sobre um monte” (Mt 5.13-14).

Pr  José Roberto Cerqueira 
(Pastor na Igreja Ministério Internacional Getsêmani-BA)

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